Bom, eu já tinha comentado aqui a tal foto de Olivia Wilde dando um chute no saco do Damon Lindelof (criador de LOST), em cena da série House.
Embora eu discorde totalmente que o pobre Damon levasse esse castigo (ainda mais com a disponibilidade dele em aparecer na série só pra zombarem dele ter sido fofa), reconheço que o final de LOST pode ter sido uma grande decepção para alguns. Nele, responsável por uma das coisas mais incríveis, inteligentes, emocionantes e soberanas que eu já vi na TV, eu não daria um chute no saco. Mas aproveitei o ensejo para citar alguns criadores e roteiristas de séries que eu nocautearia se pudesse.
Evan Katz
Ele aqui só representa alguns dos muitos roteiristas que fizeram milhões de cagadas em 24 horas. Tudo isso coroado por uma temporada final chata, cheia daquelas mesmas insuportáveis recorrências, com uma promessa de filme que impossibilitou qualquer ousadia dos roteiristas e com um último episódio que passou batido e ninguém comentou. Claudia Croitor, do Legendado.com, ainda acha que o final de 24 horas deu uma "aula" de como terminar uma série. Hein? É isso mesmo?
Chris Carter
Todos que me conhecem sabem o quanto me dói dizer isso, mas o final de Arquivo X, a série responsável por uma revolução no início da década de 90, foi um fiasco maior que saída de Amy Shermann Paladino de GG. A série, um ícone respeitadíssimo da cultura mundial, e pioneira em contar histórias a longo prazo, foi primordial para que a televisão mais tarde aceitasse o desafio de exibir tramas como a de LOST. Mas depois de as duas últimas temporadas apresentarem uma triste irregularidade, o episódio final não teve emoção nenhuma, revelação nenhuma, sambou em conceitos frágeis e salvou-se do ridículo total por muito pouco. Canceroso de volta era dispensável e Mulder vendo espíritos era de tacar a cabeça na parede.
David Rosenthal
Falando em Gilmore Girls, a Warner esqueceu que burrice também dá prejuízo e por causa de uma besteira, não quis renovar o contrato da criadora original Amy Shermann. Um de seus roteiristas principais, David Rosenthal, assumiu o comando. Resultado: uma última temporada sem charme, sem coerência, sem coadjuvantes, sem diálogos incríveis e sem a esperada última frase de Lorelai que a criadora afirmava já ter em mente desde o primeiro ano.
Max Muchtnik
Essa lista não tira, de modo algum, o mérito de séries que correram muito bem durante seus anos de vida. Mas sim castiga com um belo chute no saco seus criadores que arrumam de errar a mão logo no Series Finale. É o caso da ótima Will & Grace. O melhor sitcom da história da TV, cheio de ironia, transgresão, nonsense e inteligência terminou na sua oitava temporada com um episódio final que se não fosse o Unforgetable cantado por Jack e Karen, teria sido absolutamente descartável.
David Chase
Alguns podem achar essa menção uma heresia, mas acho que enquanto LOST foi acusada de apresentar um final cheio de pontas soltas que não satisfaziam a audiência e denegrida por isso, The Sopranos, a série do Sr. Chase, fez a mesmíssima coisa - dadas as devidas proporções - e todo mundo elogia o tempo todo, afinal, faz parte da "cartilha inteligente de assistir TV" elogiar a vida dos Sopranos sem reservas. E a série é sim, maravilhosa! Mas se construiu toda sua história baseada num imenso senso de realismo que tinha como base a crueza da explicitez visual, porque ser sutil logo no fim? Embora cheio de simbolismo e metáfora, a tão falada cena final fica devendo a seu público o que ele esperou quase dez anos pra ver: o destino de seu protagonista traduzido em imagem, como tudo na série, e não em "imaginação".
Porém, nem tudo nas séries é decepção. Alguns criadores não derraparam na curva e nos presentearam com finais dignos de suas obras. Para eles, ao invés de um chute no saco, uma bela e agradável massagem com direito a "final feliz".
Josh Schwartz
O criador do fenômeno pop The OC, teve muitos problemas entre a segunda e a terceira temporada da série. Mas todo aquele belo senso de cultura pop e inteligência sarcástica não era à toa. O moço, o mais belo criador de séries da TV atual, revolucionou em tudo. Se Marissa já não era a mocinha mais convencional, sua morte ao final da terceira temporada era ainda mais transgressora. Acabou resultando no cancelamento da série, mas nos maravilhou com uma quarta temporada redondinha, hilária, com uma Taylor irresistível e um Series Finale de cortar o coração e elevar o espírito.
Kevin Willianson
Dawson's Creek foi outro grande fenômeno pop, mas ao contrário de The OC, era mais denso, psicológico, soturno. Suas três primeiras temporadas foram um marco na TV, mas seu criador esteve presente apenas nas duas primeiras. A quarta, quinta e sexta temporada mantiveram tudo no nível da dignidade, mas perderam a ousadia habitual de Kevin. Fazendo o caminho contrário dos criadores já citados, Kevin retornou ao comando da série apenas para escrever o episódio duplo final. E o que vimos foi um show de inteligência, sagacidade, sensibilidade e humor, que acabaram encerrando o programa com todo o respeito que ele merecia.
Shawn Ryan
Muito se falava de 24 horas e Prison Break, mas uma outra série policial cortava pela lateral com um nível de qualidade pouco reconhecido pelo grande público. The Shield, sobre um esquadrão corrupto de uma periferia nos EUA, tinha um dos protagonistas mais bem escritos da TV, histórias isoladas impressionantes e uma trama central que se estendeu sabiamente por 7 temporadas. Totalmente seguro de sua criação, o grandão Shawn Ryan entregou um episódio final que é visto até hoje como o melhor final de todos os tempos no mundo das séries.
Michael Patrick King
Ele não é o criador de Sex and the City, não é nem mesmo o responsável pela adaptação do livro para a TV, mas enquanto Darren Star leva até hoje os créditos pela criação, o magrinho Michael Patrick King é, sem dúvida, a alma das personagens televisivas baseadas na obra de Candance Bushnel. O roteirista entendeu tão bem as personagens que da metade da série pra lá, era ele que escrevia todos os inícios e finais de temporada. Conseguiu o feito de entregar uma série sem nenhum episódio ruim e um encerramento que encantou até o fã mais xiita.
Allan Ball
Se ele não começar a reavaliar True Blood, é bem capaz que ganhe um lugar na lista do castigo acima, mas por hora vamos reconhecer que Six Feet Under foi impecável e sua temporada final, impressionante. O Series Finale deixa aquele friozinho na espinha e vale a pena ser visto muitas e muitas vezes.
E vocês? Em qual responsável pelo final de suas séries favoritas vocês dariam um chute no saco?
Serviço: Montagem tosca by As Dobras
- Alguém precisa trazer a série de volta!
Taí um cartaz que eu colaria tranquilo pelas ruas da cidade. Que saudade...
Pois é... a sexta temporada de Lost acabou ainda no primeiro semestre e embora muitos tenham denegrido a série depois do fim, eu continuo achando que ela é o ícone mais competente da dramaturgia televisiva mundial.
Acabo de comprar o box com a última temporada e revi tudo atentamente. Depois de ler tantas resenhas pelos blogs e sites afora, eu pensei que talvez minha admiração fosse suprimida pelos apontamentos críticos, mas não. É como se depois dessa nova maratona, eu tivesse ainda mais certeza que na maioria dos casos, estamos mesmo é diante de um monte de fãs preguiçosos e mimados, que não estão acostumados a avaliar o que está fora de suas expectativas e encontrar nisso um desafio. Eles preferem tudo que se aplique a seus padrões pseudointelectuais de surpresa e efeito, caindo sempre no cinismo e no deboche.
Lost terminou novamente pra mim ontem a noite. E foi lindo, inteligente, devastador e emocionante como da primeira vez. Eu me comovi ainda mais. E percebi que toda a discussão em torno do que não foi respondido é tão tolo, tão enfadonho. E repito, preguiçoso, porque se você fizer um esforço, você descobre um monte de coisas que estão ali, na nossa cara.
E vamos desde pequenas coisas, como porque Jacob teria ordenado que Ben elilminasse os moradores da Vila Dharma, até o problema principal da temporada, que é a origem da ilha e a realidade paralela.
Então vamos tentar fazer um esforço pra descobrir saídas pra algumas dessas perguntas?
A Origem da Ilha
Primeiro que não é a coisa mais importante. A origem da ilha não responde nada, porque provavelmente ela já estava ali quando os primeiros chegaram. E pensa bem: seria mesmo bacana que os personagens ouvissem uma explicação chata sobre porque a ilha é daquele jeito e com isso deixassem escorrer pelo ralo toda a essência do que era a série? Afinal, o título do negócio significa "perdido". Mas ainda assim, tem uma maneira de tentar vislumbrar um pouco dessa questão.
No episódo Ab Aeterno, que mostra como o imortal Richard Alpert chegou à ilha, somos informados pelo roteiro que ele veio das Ilhas Canárias. Uma pesquisa rápida no Google vai te revelar que trata-se de um arquipélago de sete ilhas que também guarda um curioso mistério: A ilha de São Brandão. Essa ilha, que é tida na mitologia como a "oitava ilha canária", já foi chamada de "Ilha Fantasma" porque os registros de seus "aparecimentos" remontam a tempos distantes e dão o que falar até hoje. Essa curiosa ilha teria propriedades estranhas, povos curiosos e o hábito irritante de aparecer em lugares diferentes. E não é que a nossa ilha de Lost também muda de lugar? Isso sem falar que as ilhas são chamadas de canárias por causa dos cães que tomavam o lugar (opa, Vincent!).
E tem os símbolos egípcios. Tá, Ok. As ilhas canárias são espanholas, mas se a oitava ilha mudava de lugar, porque não podemos aceitar a possibilidade de que em algum momento ela tenha sido descoberta pelos egípcios, que à sua maneira singular, exploraram as propriedades energéticas da ilha, interpretando-as de diversas maneiras e construindo templos (como era de seu feitio) para adorar ou proteger algumas dessas mitologias. Um indicativo disso é a estátua de Taweret, que provavelmente foi construída na ilha com a função de adorar a deusa da fertilidade, para que com isso parasse a mortalidade das mulheres que engravidavam no local.
A tal caverna de luz, que incomodou tanta gente, pode ser apenas um erro de interpretação dos próprios personagens. E que, genialmente, não foi corrigido pelos roteiristas. O que para a mãe de Jacob era uma apenas a representação positivista da natureza humana, para os especialistas da Iniciativa Dharma era o que eles tanto queriam encontrar: a fonte bruta da energia eletromagnética da ilha. Tanto que quando Desmond (o único que resistia bem aos efeitos dessa energia) retirou aquela espécie de tampão da luz, a ilha foi "desligada". É claro que havia algo de místico ali, ou o monstro de fumaça não teria sido criado no mesmo lugar, mas em Lost, a ciência e o oculto sempre andaram lado a lado. Não podemos esquecer que lá no final da 2º temporada, quando Desmond girou a chave no fundo da escotilha, a ilha foi envolta em luz, do mesmo jeito que quando mudou de lugar na 4º temporada. Quem garante que aquela chave não foi a versão moderna da "roda" girada por Ben? As duas coisas eram nada mais que catalisadores de energia.
Mas mesmo todas essas divagações visam apenas cavucar sentidos para o que nem deveria mesmo ser explicado. Afinal de contas, o livro Eram os Deuses Astronautas seria mesmo tão bacana se não se baseasse em teorias advindas da divagação? A graça do livro e da série, está em exercitar isso que acabei de fazer. E por Deus, Damon e Carlton nos presentearam com a maneira mais brilhante de pegar pessoas reais, com vidas reais, e jogá-las dentro de um contexto mitico. Ninguém fez isso melhor do que eles. Lost é a representação perfeita dessa junção de fé, ciência, mitologia e história.
O epílogo presente no box, The New Man In Charge, mata a saudade dos personagens e de quebra ajuda a amarrar algumas pontas soltas. Traz Walt de volta, mas continua sem explicar a função do menino na ilha. Como tudo em volta dele morria, acredito que ele está mais pra servir de equilíbrio das polaridades da ilha, exercendo uma função, em escala não-psicopata, parecida com a que exercia o homem de preto. Afinal de contas, Walt é o único que compartilha das mesmas pecualiaridades de Hurley e do Homem de preto (ambos viam e falavam com mortos). A diferença é que o menino era corrosivo. Parecia deter algo de maligno. O que torna sua ausência da série ainda mais sentida.
E se não bastassem todas essas maravilhas teóricas, Lost ainda tinha personagens deliciosos e no último episódio, a trágica história de gente normal, empurrada sem querer para a maior transformação de suas vidas, ganha ainda mais força quando nos deparamos com tanto respeito desses roteiristas para com eles.
O box ainda tem um extra comovente que mostra toda a movimentação dos atores e equipe para o final. Com direito a um Jorge Garcia emocionado lendo o roteiro e descobrindo o destino de seu personagem.
É isso, dude. Lost será sempre a melhor. Terá, mesmo com tanto esforço em torná-la um produto de confusão e declínio, a maior e mais inteligente trajetória dramatúrgica da história da TV mundial.
Essa gracinha aí embaixo é o mais novo sonho de consumo absoluto de toda a minha vida! O box com todas as temporadas da série é de tirar qualquer um do sério. E depois de ler tantas injustiças críticas cometidas contra a temporada final, a vontade de tê-lo é ainda maior. Ontem a série não ganhou o merecido prêmio de melhor série dramática no Emmy, mas para mim ela será sempre a melhor série dramática e de ficção científica da história da TV. Portanto, façam uma reza forte pra que eu consiga ter orçamento pra comprar essa belezinha. Preciso dela!!!!
“Monstro de Fumaça”
No impressionante episódio piloto de Lost, um grupo de pessoas se via isolado numa ilha depois de um acidente de avião. O lugar, paradisíaco, revela logo na sua primeira noite, barulhos estranhos vindos da mata fechada. Durante a primeira temporada o barulho vinha o tempo todo seguido de árvores sendo arrancadas e pessoas sendo arrastadas. O Monstro de Fumaça apareceu como ficou conhecido na temporada seguinte, e fixou sua importância na série depois que tornou-se o improvável protagonista da última temporada. É sem dúvida uma das presenças indiretas mais ambíguas dos últimos tempos numa série. Foi alvo vencedor de todas as especulações possíveis sobre sua existência e a revelação de sua origem foi um dos pontos mais controversos do fim da série. Adoro o monstro de fumaça!
“Paris Geller”
A invocada Paris, vivida de modo perfeito por Liza Weil, apareceu logo no início da já cancelada Gilmore Girls. Surgida pra ser a antagonista de Rory, era ao mesmo tempo, uma versão perturbadora dela. Era um daqueles personagens deliciosos que garantem momentos hilários e tem um código de conduta próprio que torna-se irresistível pra qualquer roteirista. A Karen de Will & Grace é um outro bom exemplo disso. Paris aos poucos foi se tornando amiga de Rory, mas sua posição de poder, opressão e insensibilidade continuaram por toda a série. Detalhes a respeito da personagem foram lançados durante os anos (como as aparições da babá que lhe criou), mas mesmo com a falta de profundidade nessa abordagem, Paris é uma das criações mais completas do mundo das séries. Suas manias, exageros e surtos sempre foram dignos de prêmio.
“Taylor Towsend”
Na terceira temporada de The OC os roteiristas precisavam de uma presença que ajudasse na expulsão de Marissa do colégio para que ela pudesse ir parar numa escola pública, onde conheceria Johnny. Para contracenar e armar com o personagem de Eric Mabius (famoso por ter vivido o chefe de Ugly Betty), foi criada então a Taylor. Uma loirinha nada popular na escola e que daria tudo para tirar o lugar de Marissa. A criação da personagem era tão desimportante, já que seria uma escada apenas, que um dos roteiristas assistentes é que ficou responsável por seu nascimento. Taylor estaria em apenas alguns episódio, mas o período em que sua função primordial terminou coincidiu exatamente com o cansaço da audiência e a perda de prestígio da série. Ao mesmo tempo, Summer e Seth precisavam de um conflito e então foi mais barato e prático transferir as intenções de Taylor pra destruir o casal. Com o intuito de aliviar o excesso de drama, Taylor foi ganhando frescores em seu texto e a ótima Autumn Reeser entendeu isso, fazendo com que a personagem fosse tornando-se cada dia mais interessante. Veio então a saída de Mischa Barton e mais uma vez, após reconhecer o apelo de Taylor com o público, os roteiristas resolveram apostar nela para a difícil quarta temporada. O resultado? A personagem salvou a última temporada do martírio. Sua força cômica era tão especial que empurrou a série para fora do poço de lama dramática onde havia sido jogada e influenciou toda a sua trajetória restante. Taylor ganhou a chance de conquistar o durão Ryan e não fez feio. Tornou-se grande amiga de Summer e protagonizou momentos imperdíveis, cheios de um humor sofisticado que poucas vezes se vê numa série. É um personagem dos mais especiais já criados sem querer e sem esperar.
“Abby Morgan”
Na primeira e aclamada primeira temporada de Dawson’s Creek, o criador Kevin Willianson, ainda na proposta de inspirar-se em filmes para escrever os episódios, quis fazer um que se baseava no longa O Clube dos Cinco, sobre cinco jovens presos na biblioteca da escola numa detenção. Nenhum deles sabe porque o outro está ali. É um clássico dos anos 80. Na versão Dawson’s Creek ele decidiu que precisava de uma provocadora e o elenco principal era formado por apenas quatro atores. Surgiu então Abby Morgan, um demônio de língua afiada que ainda tinha como souvenir os olhos enormes e firmes de sua intérprete, Monica Keena. Abby só voltou a aparecer na segunda e não menos aclamada temporada. Veio para servir de alimento para o momento de auto-destruição de Jen. E não poupou esforços. Durante essa temporada, Abby feriu, magoou e infernizou todos a sua volta, com comentários tão ácidos e inadequados que beiravam o cômico. O criador Kevin Williansom tinha o compromisso de quebrar expectativas pré-determinadas com a série e resolveu então matar Abby, numa cena intensa e chocante. O episódio seguinte ao de sua morte é um dos marcos na história da TV. Nunca nenhuma série adolescente falou de morte de modo tão eficiente. O discurso de Jen no funeral é uma aula de roteiro e a presença de Abby na série, apesar de curta, foi tão marcante que até hoje podemos encontrar sites e comunidades dedicadas a ela.
Na próxima edição: Ugly Naked Guy, Jack and Karen, Mr. Big, Gina, Six e outros que eu me lembre até lá.
Lost fazendo piada consigo mesma.
Se alguém tiver o link para um que seja Legendado, manda aí.
Lost
“The End”
As pessoas que passam pela sua vida, pelo menor tempo que seja, às vezes são responsáveis pelos seus momentos mais intensos. Tão intensos que você pode carregá-los para a eternidade.
Essa é a grande resposta para o final de Lost e gostem os cínicos ou não, é grandiosa, correta e está a altura da obra televisiva mais relevante das últimas décadas. Os criadores Damon Lindelof e Carlton Cuse abandonaram a necessidade de responder o imponderável e focaram nos personagens. Em suas camadas de profundidade. E nos presentearam com um final que fica pra história da TV mundial.
É isso. Kate, Sawyer, Miles, Richard (quem diria), Claire e Lapidus foram embora da ilha. Seis. Six. Hurley e Ben se tornaram (para minha surpresa absoluta) os novos guardiões da ilha e Jack, num epílogo de arrepiar a nuca, morre no mesmo bambuzal onde tudo começou. A realidade paralela era um embuste que escondia o que estava na nossa cara o tempo todo: estavam todos mortos, num plano em que a ligação deles era tão intensa que tornava necessário que se reencontrassem. Pra lembrar, rever e esquecer.
Hurley diz a Ben do lado de fora da igreja: “Você foi um grande número 2” e deixa claro para nós que a trajetória deles na ilha foi completa e bem sucedida, numa referência impressionante ao fato de que sim, eles realmente ficaram por lá, vendo os anos passarem, enquanto o mundo recebia de volta os novos Seis da Ajira Airways. A idéia dessa finitude é triste. Cortante. E genial. Tão real, e belo e cruel como são as viradas da nossa própria vida.
Eu não esperava que o meu desejo de ver alguns personagens saindo da ilha e outros ficando fosse ser atendido. Na minha cabeça, agora flutuam, numa mistura de prazer e melancolia, as versões continuativas de Kate e Sawyer chegando ao mundo como conhecemos e procurando viver suas vidas. E lembrando que lá, em algum lugar do oceano, numa ilha, estão Hurley e Ben, recebendo novos candidatos e tentando encontrar uma maneira de mandar Desmond de volta pra casa. Lá onde também jaz, sem que eles saibam, o corpo de Jack. Nessas versões, o tempo passa enquanto Sawyer, Claire e Kate tentam manter vivas as lembranças do que ficou pra trás. Ansiosos para o momento em que, um dia, Jack (que eles ainda pensam ser o eleito) vai fazer uma visita como antes Jacob fazia. Hurley tenta reconstruir a Vila Dharma e busca, junto com Ben, uma maneira de encontrar um substituto sem ter que usar dos mesmos meandros duvidosos que seu Jacob usava. E nesse futuro construído por mim, os que saíram da ilha vão envelhecendo, os que ficaram na ilha vivem novas aventuras que levarão ao novo guardião, e vão morrendo para então terem a chance de reencontrar aquelas figuras que representaram o período mais intenso de suas histórias pessoais.
Não posso expressar o quanto estou comovido com tamanha sensibilidade nesse desfecho. Muito melhor do que saber qual a origem da ilha é ver aquelas pessoas compreendendo a grandiosidade do que elas viveram. Em meia hora de episódio isso já ficou claro pra mim. Os emocionantes reencontros de Sayd e Shannon, Claire e Charlie e Sawyer e Juliet (com direito à troca do mesmo diálogo de quando ela morreu em seus braços e ele dizendo emocionado “eu te achei”), foram só alguns exemplos de que o importante era falar sobre o impacto daqueles eventos naquelas vidas. Imagina você, que tivesse vivido tamanha experiência em sua vida? Quantas vezes passamos por períodos em que nosso mundo se fecha para um grande acontecimento que vai durar alguns dias ou meses. Durante aquele período, que pode ser o seu curso, a sua faculdade, o seu tempo de colégio ou férias numa outra cidade, aquelas pessoas que te cercaram se conectaram à você de um jeito que o tempo nunca vai conseguir destituir. E vocês vão se reencontrar. E lembrar. E essa ligação terá sido tão forte que vai ultrapassar as barreiras naturais, do nosso entendimento, e refletir um universo único e especial. Para os personagens de Lost, esse evento foi um acidente de avião, quando caíram numa ilha muito estranha, cheia de enigmas e mistérios, com a missão de interferir em sua história, e pagando o preço de algumas vidas por isso.
Sinceramente, caguei para o que não foi esclarecido. Caguei para o que foi, mas nem tanto. E cagarei para os que estiverem aí reclamando que a realidade paralela não serviu pra nada. Serviu pra tudo! Serviu para tornar aqueles personagens mais críveis, ao percebermos que na morte eles tiveram as “vidas” que sempre sonharam ter e que não tiveram a chance de realizar. Pensa como reside nisso uma tristeza um pouco terna, quando pensamos que Sawyer só queria usar sua força e destreza para servir. Que Desmond precisava da aprovação do homem que importava mais do que ele pensava importar. Que Jack tinha um filho pra quem seria o melhor pai que pudesse ser e que Hurley teria muita, muita sorte. Até mesmo o destino de Kate, um dos poucos que não foi alterado dentro da realidade paralela (não para o que dizia respeito à ela própria) ou no de Ana-Lucia (que provavelmente não estava pronta para entender o que ocorreu), havia um determinado senso de tranqüilidade.
O episódio enquanto ação não ficou devendo nada pra ninguém. Um Series Finale respeitável. Com direito à ilha desmoronando, Locke-Esfumaçado numa briga histórica com Jack no alto do penhasco (que eu sempre achei a melhor locação e que estava sendo pouco explorada), o avião da Ajira decolando e atravessando a ilha ao mesmo tempo em que Jack olhava para o mesmo céu de seis anos atrás. A dimensão de Lost é tão relevante, que só de ver Elizabeth Mitchell saindo de “V” para reencontrar sua Juliet e Ian Somerhalder tirando uma folga de The Vampire Diaries para reviver seu Bonne, a gente já sabe que não estamos diante de uma série qualquer. Estamos diante de Lost. Um drama humano, que precisa ser tratado como tal, acima de tudo. Jamais me cansarei de repetir isso.
Eu, parado diante da TV, aos prantos, acabando de passar por duas horas de adrenalina e felicidade total, de súbito percebi que tudo se costura totalmente se pudermos ser capazes de compreender uma premissa única: Jamais teremos condições de desvendar todos os mistérios de um lugar que os guarde em si. Se ele for misterioso mesmo, daqueles bons, jamais poderemos. Se tivermos a chance de um dia passar algum tempo em algum lugar assim, talvez uma ou outra coisa nos possa ser desvendada, vista, entendida dentro do possível. Mas ao passo em que nossa vida for suficientemente alterada por ele a ponto de chegar a hora de partir, mesmo assim, vamos ter deixado pra trás uma infinidade de pontas soltas. Porque uma história que almeja ser contada sob o prisma mais verossímil, tem que saber que nem tudo acaba quando a porta fecha e que quando você sair, vão permanecer um monte de coisas que só os que ficaram vão desvendar. Mas mesmo assim, você se refestela pelo que viu, viveu. Não é porque a sabedoria não vem plena, que a trajetória deixa de ser fantástica. Ontem Lost fechou uma dessas portas, com um monte de coisas que não pudemos desvendar, mas também deixando como herança muita pauta, aprendizado, informação, cultura e muitas, muitas saudades do quanto era bom ver, rever... e discutir.
Promo final e spoiler do fim: Walt is back!!
Lost
"What They Died For"
Depois de seis anos, muitos mistérios e polêmicas, Lost chegou ao seu penúltimo episódio semana passada. Embora não seja o último, começo com esse texto porque acho que o que ainda precisava ser dito sobre a mitologia da série foi esclarecido nesse episódio e que o se desenha para o final é uma convergência das realidades e a explicação para o teaser do início dessa temporada.
A caverna luminosa de Across the sea assombrou todos os fãs desde então. Os defensores buscam explicar a natureza emocional e mitica com que ela foi concebida. Os mais "exigentes" responderam com fúria. Essa semana, Lost retorna ao ponto de partida para anunciar o fim. Os olhos de Jack se abrem pela última vez com ele em sua condição humana intocada. Ao final desse capítulo, ele já será o novo Jacob.
Finalmente os sobreviventes puderam ouvir, naquela fogueira, a razão pela qual foram levados até ali. Cumprindo a coerência de seus princípios, Jacob lhes oferece a oportunidade de entenderem as necessidades de proteção da ilha e pede que alguém se ofereça. Jack aceita o posto na frente de um horrorizado Hurley, que diz "Estou feliz por não ter sido seu". E junto com ele, Kate e Sawyer completam o triste quadro desse destino que lhes foi conferido. São apenas eles, depois de tanto tempo, que sobreviveram para ouvir as razões pelas quais passaram por tanto sofrimento.
Jacob resolve mais um enigma ao dizer a Kate que o nome dela foi riscado porque ela tornou-se mãe. Assim descobrimos que Jin era o candidato e que Sun não viajou para os anos 70 quando voltou à ilha porque já tinha sido descartada. Numa resposta sábia aos mais chatinhos que insistiam em estranhar os caminhos opostos que o casal tinha tomado.
Outro ciclo se fechou com a morte de Widmore. Seus planos ainda parecem confusos, mas parece que será Desmond (muito justamente) a peça chave para o fechamento das cortinas. Ben também parece ter extinto seu papel na ilha, ao matar Widmore e na realidade paralela, encontrar uma modificada Russeau. Embora algo ainda possa ser guardado para o personagem, o entendimento quanto à ele parece concluído. Ben pagou pelo próprio orgulho e agora tenta limpar sua sujeira.
Na realidade paralela o movimento pela reunião dos personagens permanece. Tivemos um vislumbre bacana de Ana Lucia mas continuamos sem saber quem é a mãe do filho de Jack e como isso vai afetar essas pessoas que passaram a existir apenas nessa realidade e também as que ressuscitaram nela.
A grande e maior questão agora parece ser desvendar como Damon e Carlton vão julgar os destinos dessas pessoas. Sinceramente, não me parece possivel que qualquer deles redescubra a rotina do mundo depois de tudo que passaram. Se Jack permanecer mesmo como o novo Jacob e se terá um rival à altura do Monstro-de-fumaça, parece secundário diante do quanto pode ser arriscado determinar o fim de personagens como Kate e Sawyer que só saíriam ganhando mesmo com a morte. Nenhum deles pode cair no lugar comum.
Pois é, segunda-feira o mundo já saberá como terminou a maior série de todos os tempos. E depois, saberá como é o vazio depois dela.