Domingo, 16 de Julho de 2006
O Intuito
Lá se vão quase dois meses em que esse blog está situado num espaço/tempo restrito e não esclarecido.
Providências...
Listas? Acho que não... já está se tornando um acessório linguístico um pouco batido. É eficiente, mas não sei...
Ok. Listas...
Mas eu gostaria de ser um pouco mais emocional. Listas são tão capitalistas. Coisa de gente excessivamente pragmática. Coisa de gente que faz lista pro supermercado e pra própria vida no mesmo tom e com o mesmo intuito.
Intuito... Bacana essa palavra. Eu não usava ela há muito tempo.
Então, meu intuito é bem diferente.
São sete meses com o Gustavo. Um mês morando juntos e vários anos me "perceptindo".
É estranho isso. Eu não sei por onde começar, mas sei que tenho que começar alguma coisa. Eu não sei o que dizer, mas tenho que dizer alguma coisa. Eu não sei me desmembrar, mas sinto o intuito.
Eu queria pressionar a eternidade. Tranformá-la em matéria e mesmo assim, produzir o etéreo.
Esse é o meu intuito...
Hoje eu acordei gripado e fiz compras pra casa.
Comprei um escorredor, um pano de prato e dois de chão. Comprar pano de chão é uma coisa engraçada, né? A gente paga por um pedaço de pano que vamos esfregar no chão até encardir de vez. E a impressão que eu tenho é que esse é um luxo do século vinte e um. Minha mãe e antes dela, minha vó, usavam as boas e velhas camisas velhas pra limpar a casa ou absorver as poças de água causadas por tropeços ou pela chuva. Eu mesmo de vez em quando, ainda dou de cara com antigas camisas Hering espalhadas pelo chão da casa da minha mãe.
Casa da minha mãe...
Não é mais minha casa. Embora eu esteja sempre lá jantando com o Gustavo, não é mais minha casa. Minha mãe recebe a mim e ao meu namorado muito bem, mas não é mais minha casa.
Minha casa agora é minha! E dele.
E a gente compra pano de chão na lojinha. Pague 1,45 e esfregue sua casa com material profissional.
É estranho ter uma casa. Saber que você precisa vestir, limpar, alimentar essa construção como a uma criança. É claro, todo mundo tem uma casa. Mas é a sua casa!!! E é engraçado olhar pra essa gestação precipitada e requerida.
Agora tenho um amor... e uma cabana.
E quando as pessoas vêem que você alcançou algum outro estágio planejado, elas também renovam as expectativas pra com você.
Chegou a era do "Cê tá feliz???".
A nova pergunta preferida do staff cíclico da minha vida.
E eu tô...
Sei lá... Eu tô feliz.
O Gustavo venceu as barreiras que o impediam de se libertar e se entregou a mim totalmente. Dando-me uma linda prova de amor.
Eu tô feliz.
E a pergunta dos outros tem o mesmo intuito: profetizar o limite dessa felicidade.
Em todas elas, há um tom inconsciente e levemente melancólico que parece querer dizer: vá lá, aproveite enquanto há tempo.
Pensei sobre "Leland" e em todo o seu torpor causado pela inclinação pra enxergar a tristeza... E me sinto meio assim. Hiper capaz de sentir. Hiper capaz de me ver numa letra do Oswaldo e ao mesmo tempo, numa cena de um filme do Curtis.
Mas também decidido a fugir dessa felicidade datada e por conta disso, me forçando a não ser tão feliz... Caminhando com olhos absortos como os de Leland e depois, focando ainda uma certa doce tristeza da vida.
Assim me mantenho eu mesmo. Mas afasto um próprio renovar de mim.
Amadurecemos quando nos decidimos a superar as fraquezas (como amar, chorar ou ceder), mesmo que elas sejam indispensáveis. Mas nosso arsenal de defesa é ranzinza. Cínico. Resvala no patético e no infantil. Nos veste de uma superioridade capenga e que só serve pra nos transformar em personagens chocantes e de importância discutível. Os coadjuvantes da história alheia. Como aqueles de texto sagaz que tem vários em volta de sí na mesa, mas que acaba sempre indo pra casa sozinho.
Tem sido bom pensar em estar feliz. E por vezes, muitos não enxergam que eu assim me torno feliz.
Eu e meu amor e nossa cabana, diferimos sim das mansões revestidas de desesperança que nos proferem essa profetização do fim. Não porque achamos que o arco-íris será sempre colorido, mas porque sabemos que mesmo sem o dom de pressionar a eternidade, nosso intuito de acreditar nela, nos protege do cinismo que caracteriza as sequelas desse fim.